domingo, 27 de junho de 2010

Jesus, feliz com sua moto


Por: Wilame Prado

São Paulo (SP) – Quando o descarregador e vendedor de verduras Jesus Benício Cardoso, 44, chegou ao prédio de O Diário, na avenida Mauá, o ronco do motor e o som dance que saía de um antigo toca-fitas foram chamarizes para alguns repórteres, editores e fotógrafos, aguçados pela curiosidade, darem uma escapadinha da redação e ver de perto o curioso meio de locomoção que acabara de estacionar em frente.

Uma motocicleta invocada, com mais de 50 acessórios, incluindo cabeças de bonecas, placa de táxi, esporas, chuveiro, alto-falantes e outros penduricalhos mais, que deixam a Motovi, ano de 1977, 125 cilindradas, pesando 150 quilos a mais do que o seu peso comum, é a grande paixão de Jesus, é o que lhe representa liberdade, é um sonho realizado há 24 anos (quando conseguiu comprar a moto), é o meio que o leva a pelo menos seis encontros motociclísticos por mês, realizados em um raio de até 400 quilômetros de distância.

Pode parecer impossível, mas Jesus também consegue pendurar em sua moto réplicas de bichos, como sapos, pererecas e cobras, talvez suas companhias imaginárias, já que ele não segue nenhum grupo de motoqueiros, preferindo pilotar sempre sozinho.

Se perguntarem por aí o que é "Animais do Asfalto", graças aos seus répteis, é bem certo que dirão se tratar daquela moto.

É inevitável, quando Jesus está pilotando, não deixar de olhar para o seu meio de locomoção. Mas, acreditem, a história desse trabalhador, que diz saber ser negro e motociclista o suficiente para se desvencilhar dos preconceituosos, que foi em busca do seu sonho de liberdade por meio da velocidade sobre duas rodas, é mais intrigante do que a própria moto.

Quando se conhece um pouco melhor Jesus, o velho e sábio ditado, aquele que diz que as aparências enganam, vem a calhar de uma maneira surpreendente.

Entre verduras e viagens

Faz 23 anos que é assim: às 3 horas da manhã, Jesus acorda, pois tem de estar no Ceasa às 4 horas para trabalhar como descarregador até às 10 horas. Para ele, o dia de trabalho está só começando.

Enxergando a possibilidade de um novo negócio, Jesus também passou a comprar verduras para revender, no começo da noite, de porta em porta, em alguns bairros de Maringá. Para isso, porém, ocupa o restante da manhã e um pedaço da tarde para, juntamente com sua família, embalar as verduras em casa.

Acostumou-se, Jesus, a dormir pouco. Não é raro estar ainda acordado às 23 horas. Ainda lhe restam sagradas quatro horas para ouvir o despertador e dirigir-se ao Ceasa. Parece pouco, mas essas horas de sono, em épocas passadas, deixavam de existir na noite do sábado para o domingo.

Confesso apaixonado pelo mundo das duas rodas, saía de casa, no sábado pela manhã, rumando a qualquer encontro de motociclistas. O problema é que, no domingo, às 4 horas, precisaria começar a descarregar as verduras.

Não havendo solução, jamais titubeava e encarava a escuridão da madrugada juntamente com sua moto e seus penduricalhos para chegar a Maringá faltando uma hora, até menos às vezes, e, logo em seguida, "bater o cartão" no Ceasa.

Hoje, ele já não precisa se arriscar tanto nas estradas, pois não trabalha mais aos domingos. O único tombo da sua vida, aliás, aconteceu num momento de vacilo, voltando para Maringá, perto de Campo Mourão, quando o sono o venceu e, inevitavelmente, foi ao chão.

"Motociclista também dorme na estrada. Mas, não aconteceu nada de muito grave. Levantei a moto e continuei seguindo viagem", recorda-se.

Como consegue ter tanta energia para conciliar viagens e o trabalho, nem mesmo Jesus consegue explicar ao certo. Mas diz desconfiar que seja o contato constante com frutas, legumes e verduras. "No meu trabalho, é 24 horas comendo fruta".

Bonecos
Uma das características marcantes da moto de Jesus são as cabeças de bonecos penduraras. Um dos primeiros a fazer isso na região, ele diz ter se inspirado no grupo de motociclistas Abutres Brasil.

http://odiario.com

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